sexta-feira, fevereiro 06, 2015

Seguindo as massas: efeito manada e groupthink

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No livro “The Crowd: A study of popular mind”, Le Bon (1896) realizou um dos primeiros trabalhos afirmando que existe uma diferença comportamental entre decisões tomadas por aglomerados de pessoas e por indivíduos isoladamente. O autor explica que os indivíduos de forma isolada apresentam uma maior capacidade de dominar seus reflexos em relação às massas.

De forma geral, Le Bon (1896) afirma que as massas apresentam um comportamento mais impulsivo, no qual existe uma falsa sensação de poder.

Este texto trata sobre dois comportamentos de indivíduos diante de movimentações em massa: groupthink e efeito manada. Tais comportamentos assemelham-se por inibirem uma posição racional de um indivíduo diante de apelos e escolhas tomadas por uma grande quantidade de pessoas.

Resumidamente, groupthink diz respeito ao comportamento de um indivíduo que deixa de manifestar sua opinião em prol de um consenso do grupo. Este comportamento reflete-se no receio de falar em público e também em voltar atrás em uma opinião.

O efeito manada, por sua vez, não está necessariamente ligado a decisões que exijam consenso, mas refere-se a um comportamento no qual um indivíduo realiza aquilo que as demais pessoas estão fazendo, muitas vezes sem parar para refletir sobre a decisão tomada. É o popular "maria vai com as outras".


Groupthink: em prol do consenso


Groupthink, de forma geral, refere-se a uma busca prematura por um consenso entre os membros de grupos, muitas vezes deixando a racionalidade e uma análise mais detalhada do problema de lado (Janis, 1982).

Grupos, assim como indivíduos, tomam diversas decisões através de atalhos mentais. Conforme Janis (1982, p. 3), os grupos podem trazer à tona o que há de melhor ou o que há de pior nos homens. Em situações de crise extrema, por exemplo, o comportamento dos grupos pode gerar pânico coletivo, atos violentos, entre outras manifestações que Janis (1982) chama de loucura dos grupos.

O termo “groupthink” foi utilizado inicialmente por Janis (1982) para se referir a um modo de pensar no qual as pessoas se envolvem quando estão profundamente engajadas em um grupo coesivo. Ou seja, ocorre quando esforços dos membros dos grupos para obter unanimidade nas decisões sobrepõem a motivação pessoal de cada membro do grupo de avaliar de forma realista as suas ações.

Um alto nível de amabilidade e de espírito de equipe entre os membros do grupo são manifestações de que os membros valorizam grandemente a sua participação naquele grupo e desejam permanecer afiliados, para Janis (1982, p. 245) este é o conceito de coesividade. Um elevado nível de coesividade em um grupo pode levar a ocorrência de groupthink.

Janis (1982, p. 174) apresenta três tipos de sintomas para a ocorrência do groupthink: (i) superestimativas dos grupos; (ii) mente fechada; (iii) pressão para a uniformidade.

1. Superestimativas dos grupos

O primeiro tipo de sintomas diz respeito a uma ilusão de invulnerabilidade e uma crença inquestionável a respeito da boa moral do grupo, levando os membros a ignorarem as consequências morais e éticas de suas decisões.

2. Mente fechada

O segundo tipo de sintomas da existência de groupthink existe quando os grupos realizam esforços coletivos a fim de buscar racionalizar informações que possam levar os membros a reconsiderar suas premissas previamente assumidas. Neste tipo também se enquadra um sintoma de quando os grupos apresentam visões estereotipadas de seus líderes inimigos.

3. Pressão para a uniformidade

O terceiro tipo de sintoma de groupthink tratado por Janis (1982, p. 175) está relacionado a pressões que levam os membros dos grupos a agir com uniformidade. O autor afirma que uma visão de unanimidade compartilhada pelos membros do grupo faz com que qualquer indivíduo que apresente fortes argumentos contra o consenso do grupo sofra pressão para se adequar aos estereótipos e ilusões compartilhadas pelo grupo.

Janis (1982) afirma que, na média, quanto maior a frequência com que um grupo demonstra os sintomas do groupthink, pior será a qualidade das decisões deste grupo.

Por exemplo: os grupos limitam suas escolhas apenas a poucas alternativas. Depois disso, os membros ignoram novas alternativas enfatizando seus riscos e desvantagens, ao mesmo tempo em que ignoram as vantagens e benefícios das alternativas descartadas. Finalmente, devido à confiança dos membros de que tudo ocorrerá bem, os membros falham em considerar o que dará errado e não desenvolvem planos alternativos (ALDAG e FULLER, 1993).

O efeito manada: seguindo a tendência

O termo "manada", quando utilizado na natureza, pode representar segurança. Mas quando o termo é aplicado para humanos, especialmente no contexto financeiro, a história muda.

O efeito manada é sinônimo de "seguir a tendência" e pode ser observado em diversos mercados, como o imobiliário e o de ações. Bekaert et al. (2014) explica que no efeito manada os investidores param de classificar os ativos por seus valores fundamentais. Além disso, este efeito pode conduzir um mercado à bolhas especulativas.

"O surgimento de bolhas especulativas é explicado como um processo auto-organizado de infecção entre os traders, que leva a preços de equilíbrio que se afastam dos valores fundamentais" (Lux, 1995). 

No meio científico, o efeito manada, embora muitas vezes identificado, costuma aparecer em baixa intensidade. Neste sentido, Lux (1995) explica que os especuladores não são simplesmente seguidores cegos da multidão: eles reagem rapidamente sobre o comportamento dos outros, a fim de não perder oportunidades de lucro, mas também tentam descobrir se o otimismo ou pessimismo prevalecente tem uma base sólida para o desenvolvimento real do mercado.



Por fim, em grandes proporções o efeito manada pode inclusive levar a um contágio financeiro. O efeito contágio pode ser entendido como a interferência das oscilações de um mercado em outro país ou região. Ainda, Bekaert et al. (2014) afirmam que o contágio aparece de forma mais substancial em portfolios de investidores individuais dentro de um mercado específico.

Conclusões

Tanto o groupthink quanto o efeito manada se referem a comportamentos de grupos, principalmente de grandes grupos ou massas. Os dois conceitos são distintos, embora próximos: groupthink refere-se a um comportamento no qual um ou alguns indivíduos tendem a deixar de manifestar sua opinião contraditória a fim de favorecer um consenso do grupo. Já o efeito manada diz respeito a seguir a tendência, mesmo que a decisão seja individual e não exija um consenso. Em grandes proporções, tais efeitos podem gerar sérios impactos em determinados ativos ou até mesmo em um mercado como um todo.

Referências

Bekaert, G., Ehrmann, M., & Fratzscher, M. (2014). The Global Crisis and Equity Market Contagion. Journal of Finance, 69(6), 2597 – 2649. 
Cipriani, M., & Guarino, A. (2005). Herd Behavior in a Laboratory Financial Market. The American Economic Review, 95(5), 1427–1443.
Janis, I. (1982). Groupthink: psychological studies of policy decisions and fiascoes (2nd ed.). Boston: Houghton Mifflin Company.
Le Bon, G. (1896). The crowd: a study of the popular mind. London: Ernest Benn.
Lux, T. (1995). Herd behaviour, bubbles and crashes. The Economic Journal, 105(431), 881–896.
Shiller, R. J. (1995). Concersation, information and herd behavior. Rhetoric and Economic Behavior, 85(2), 181–185.
Prates, W. (2012). A tomada de decisão individual e em grupo. Universidade Federal de Santa Catarina. Retrieved from http://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/99256

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