sábado, novembro 21, 2015

Todas as empresas, sejam elas públicas ou privadas, necessitam realizar análises de viabilidade econômica para seus projetos de investimentos. O estudo da viabilidade econômica de um projeto de investimento é denominado de engenharia econômica.

A engenharia econômica pode ser compreendida como um conjunto de princípios e técnicas necessários à tomada de decisões sobre alternativas de investimentos.

Em geral, aplicam-se estas técnicas para a tomada de decisões de longo prazo. Dentro de uma empresa seriam aquelas decisões sobre os ativos não circulantes (antigo ativo permanente).

Entre os inúmeros casos possíveis de investimentos que uma empresa pode realizar, podemos citar a compra de máquinas, de imóveis, compra de participação acionária em outras empresas, expansão de uma unidade fabril, entre outros.

#1. Payback Simples

O payback, ou período de payback é o método mais simples para se analisar a viabilidade de um investimento. É definido como o número de períodos (anos, meses, semanas etc.) para se recuperar o investimento inicial. Para se calcular o período de payback de um projeto basta somar os valores dos fluxos de caixa auferidos, período a período, até que essa soma se iguale ao valor do investimento inicial.

Uma vez que o período de payback é encontrado quando os fluxos de caixa "pagam" o investimento, então basta somar os fluxos de caixa ao valor do investimento inicial, conforme a tabela a seguir:
n FC Saldo
0 -1500 -1500
1 150 -1350
2 1350 0
3 150
4 -80
5 -50


No exemplo, o payback é de 2 anos!

Vantagens:
  • Simplicidade e rapidez;
  • É uma medida de risco do investimento, pois quanto menor o período de payback, mais líquido é o investimento e, portanto menos arriscado.
Desvantagens:
  • Não considera o valor do dinheiro no tempo;
  • Não considera os fluxos de caixa após o período de payback;
  • Não leva em conta o custo de capital da empresa.
O método do payback não é um método recomendado, embora seja muito usado na prática, principalmente por leigos em matemática financeira.

O principal problema deste método está em não considerar o valor do dinheiro no tempo, o que o torna um método matematicamente incorreto, pois destoa dos conceitos de relações de equivalência entre taxas da matemática financeira.

#2. Payback Descontado

Este método é semelhante ao payback, mas com o adicional de usar uma taxa de desconto antes de se proceder à soma dos fluxos de caixa. Em geral esta taxa de desconto será a TMA.

Neste método, todos os fluxos de caixa futuro deverão ser descontados por esta taxa em relação ao período ao qual o fluxo está atrelado. Por exemplo, se desejássemos trazer a valor presente (VP) um fluxo que estivesse a 5 períodos futuros, o procedimento seria o seguinte: \begin{gather} VP_{FC_5} = \frac{FC_5}{(1+TMA)^5}, \end{gather} Suponha que o valor desse fluxo é R\$500 e a TMA é 12%, então: $VP_{FC_5} = \frac{500}{(1,12)^5}=283,71$.

Logo, o payback descontado é igual ao payback simples, com a diferença de que considera os fluxos descontados (trazidos a valor presente) para encontrar quando os fluxos de caixa pagam o investimento inicial. Confira o que ocorre com o payback descontado aplicado ao mesmo fluxo de caixa utilizado para exemplificar o payback:

n FC VP VP Acumulado
0 -1500 -1500 -1500
1 150 136,36 -1363,64
2 1350 1115,70 -247,93
3 150 112,70 -135,24
4 -80 -54,64 -189,88
5 -50 -31,05 -220,92


No caso deste exemplo, o investimento nunca irá se pagar! Isto ocorre porque o valor presente acumulado não chega a zero.

Segue outro exemplo para calcular o payback descontado:
n FC VP VP Acumulado
0 -1500 -1500 -1500
1 0 0 -1363,64
2 0 0 -247,93
3 450 338,09 -1161,91
4 1050 717,16 -444,74
5 1950 1210,80 766,05


Percebe-se que desta vez o investimento terá, sim, um período de payback descontado, e este valor estará entre o fluxo de caixa 4 e o fluxo 5. Mas como encontrar o valor exato do momento em que ocorrerá o período de payback? Basta dividirmos o último fluxo de caixa negativo pela soma do último fluxo negativo com o primeiro fluxo positivo, em valor absoluto, da seguinte forma: \begin{gather} \frac{|-444,74|}{|-444,74| + |766,05|} = \frac{444,74}{1210,79} = 0,37 \end{gather}

Ou seja, além dos 4 anos, ainda será necessário mais 37% de um ano para que ocorra o período de payback descontado, isto é, 4,37 anos!

Vantagens:
  • Continua simples e prático, como o payback simples;
  • Resolve o problema de não considerar o valor do dinheiro no tempo.
Desvantagens:
  • Apesar de considerar uma taxa de desconto, continua sem levar em conta os fluxos de caixa após o período de payback.


#3. Valor Presente Líquido (VPL)

Este método consiste em trazer para a data zero, usando como taxa de desconto a TMA da empresa ou projeto, todos os fluxos de caixa do investimento e somá-los ao valor do investimento inicial. Matematicamente, pode ser dado pela equação abaixo:
\begin{equation} VPL = FC_0 + \frac{FC_1}{(1+TMA)^1} + \frac{FC_2}{(1+TMA)^2} + \dots + \frac{FC_n}{(1+TMA)^n} \label{eq:vpl} \end{equation}
O termo $FC_0$ da Equação \ref{eq:vpl} representa o fluxo de caixa do período zero, isto é, o investimento inicial. Normalmente este termo entrará com sinal negativo na equação do VPL.

A Equação \ref{eq:vpl} também pode ser entendida da seguinte forma:
\begin{equation} VPL = \sum _{ n=0 }^{ N }{ \frac{FC_n}{(1+TMA)^n} } \label{eq:vpl2} \end{equation}
O VPL é o método mais recomendado sob o ponto de vista econômico. Possui algumas vantagens, como:
  • leva em conta o valor do dinheiro no tempo;
  • leva em conta o custo de capital da empresa (TMA);
  • pode ser aplicado a qualquer fluxo de caixa (convencional e não convencional);
  • e também pressupõe a reinversão dos fluxos de caixa à TMA.
No entanto, o VPL também possui algumas desvantagens, como:
  • Ele exige o conhecimento de diversos parâmetros, principalmente no que tange uma precisa estimativa dos fluxos de caixa que serão utilizados para análise.
  • O VPL é definido em termos absolutos (unidades montérias) ao invés de relativos, não levando em conta a escala do projeto.
  • No VPL, projetos grandes, que involvem um grande montante de investimento inicial, tendem a apresentar um VPL superior a projetos menores, mesmo que estes projetos grandes não sejam necessariamente melhores em termos relativos.
Para finalizar, o VPL também não considera a vida do projeto, isto é, o prazo de duração de cada projeto. Por isso, de forma análaga ao problema de escala, um projeto com maior duração possui um viés para apresentar um VPL superior, mesmo que não seja a melhor opção, caso fosse possível repetir o projeto de menor duração por algumas vezes.

#4. Taxa Interna de Retorno (TIR)

A TIR é a taxa de retorno do empreendimento, considerando o valor do dinheiro no tempo. É a taxa de desconto que zera o valor presente líquido dos fluxos de caixa de um projeto, ou seja, faz com que todas as entradas igualem todas as saídas de caixa do empreendimento. Matematicamente, esta taxa (TIR) pode ser encontrada igualando a equação do VPL à zero e resolvendo a seguinte expressão:
\begin{equation} 0 = FC_0 + \frac{FC_1}{(1+TIR)^1} + \frac{FC_2}{(1+TIR)^2} + \dots + \frac{FC_n}{(1+TIR)^n} \label{eq:tir} \end{equation}
A TIR possui como vantagens o fato de:
  • considerar o valor do dinheiro no tempo;
  • ser fácil de comparar investimentos e de levar em conta a escala e a vida dos projetos, devido ao seu caráter relativo (resultado expresso em percentual) e não absoluto, como o VPL.
Algumas das desvantagens da TIR são:
  • pressupõe a reinversão dos valores à própria TIR (resultando em taxas "sub" ou superestimadas;
  • pode haver múltiplas taxas de retorno, ou mesmo não ter solução, dependendo do fluxo de caixa do projeto;
  • não é recomendada em situações de projetos com fluxo de caixa não convencional.
A TIR normalmente não é calculada manualmente, pois sua resolução gera a necessidade de resolver equações polinomiais. Se o problema apresentado possuir um fluxo de caixa de até dois períodos, podemos encontrar a TIR por meio de uma equação de segundo grau.

Como a TIR não possui uma fórmula algébrica para ser calculada diretamente, ela pode ser encontrada por meio de tentativa e erro, tanto manualmente, quanto por algorítmos computacionais.

Conclusão

Os métodos de engenharia econômica (análise de investimentos) comentados neste texto são os mais comuns de serem encontrados e utilizados. O payback, tanto simples quanto descontado, não é um método recomendado, pois os fluxos de caixa após o período de payback são desconsiderados. Já a TIR tem como seu maior problema o fato de supor que os fluxos de caixa são reinvestidos na própria TIR, o que dificilmente ocorrerá na prática.

Portanto, dos três métodos citados (payback, VPL e TIR), o mais coerente e que pode ser utilizado na maioria dos casos é o Valor Presente Líquido (VPL). No entanto, isso não significa que o VPL também não possui os seus problemas, como comentado ao longo do texto.

Engenharia econômica: payback, valor presente líquido (VPL) e taxa interna de retorno (TIR)

terça-feira, maio 26, 2015

Em disciplinas introdutórias de economia as curvas de indiferença sempre aparecem. Uma curva de indiferença mostra diversas possibilidades de combinações de bens, de tal forma que o consumidor se torna indiferente a optar por qualquer uma delas. Logo, não há preferência entre uma combinação ou outra dentro de uma única curva, pois todas as possibilidades resultam em um mesmo nível de satisfação, ou seja, a utilidade permanece constante.

Um exemplo ...

Podemos supor que um indivíduo qualquer possui um nível de educação "x", representado pela curva azul da figura a seguir.


Tal nível de educação leva o indivíduo a escolher um determinado estilo de vida que lhe proporciona uma certa renda e uma determinada quantidade de dias de folga por mês.

Também podemos supor que, dentro desta curva na qual o indivíduo se encontra (linha azul), quanto menos dias ele folgar em seu trabalho, maior será a sua renda ao final do mês. Além disso, caso esta pessoa decida se especializar na sua área ou opte por não estudar e se tornar desatualizado em sua profissão, a curva de renda $\times$ dias de folga será alterada para a direita ou para a esquerda, respectivamente.

Neste exemplo, a curva de indiferença será convexa, pois indica a diminuição da utilidade marginal, ou seja, quanto mais dias de descanso um indivíduo possui, menos ele dá valor a um dia extra de folga.

Mas o que há de errado?

Digamos que o indivíduo em questão opte pelo ponto "A" da curva e trabalhe por alguns anos desta forma, ou seja, com a mesma renda e com os mesmos dias de folga (para fins de exemplificação podemos supor um mercado onde não existe inflação, fazendo com que não ocorra alteração no poder de compra deste indivíduo).

Segundo a teoria econômica neoclássica, esta pessoa não iria se importar de, em qualquer momento, alterar sua posição do ponto "A" para o ponto "B", dentro da mesma curva de utilidade. Sendo assim, o indivíduo do exemplo deveria ser indiferente em relação a ganhar menos mas com mais dias de folga, mesmo se já estivesse acostumado a viver com um nível maior de renda e com menos dias de descanso.

Embora as curvas de indiferença sejam muito utilizadas na economia, no exemplo citado e em vários outros, tais curvas representam uma situação não realística. Por exemplo, embora a teoria econômica diga que o indivíduo do exemplo não se importaria de mudar do ponto A para qualquer outro ponto da mesma curva, sabemos que isso não acontece no dia-a-dia, pois nem sempre uma pessoa estaria disposta a abrir mão de uma renda mais elevada em troca de mais dias de lazer. Isto ocorre porque os seres humanos, de forma geral, ao tomarem suas decisões, levam em consideração um ponto de referência baseados no contexto em que estão envolvidos.

O ponto de referência pode representar a resistência que as pessoas possuem à mudanças, ou seja, o status quo, a situação atual. A ideia de que os seres humanos decidem com base em um ponto de referência foi uma das principais contribuições da Teoria do Prospecto.

No exemplo apresentado, o fato de o indivíduo migrar do ponto "A" para o ponto "B" representa uma perda, pois o ponto "A" se tornou um ponto de referência. Assim, dentro da curva de indiferença representada pela linha azul, esta pessoa provavelmente não aceitará ganhar menos em troca de mais dias de folga.


Considerações

A análise das curvas de indiferença se torna incompleta na medida em que consideramos a necessidade de incluir um ponto de referência. É este ponto que fará com que um indivíduo entenda algo como um ganho ou como uma perda. Portanto, aquilo que estiver acima (ou abaixo) do ponto de referência será considerado um ganho (ou uma perda).

Referências

Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar (p. 607). Rio de Janeiro: Objetiva.

O que as curvas de indiferença não mostram?

sexta-feira, fevereiro 06, 2015

No livro “The Crowd: A study of popular mind”, Le Bon (1896) realizou um dos primeiros trabalhos afirmando que existe uma diferença comportamental entre decisões tomadas por aglomerados de pessoas e por indivíduos isoladamente. O autor explica que os indivíduos de forma isolada apresentam uma maior capacidade de dominar seus reflexos em relação às massas.

De forma geral, Le Bon (1896) afirma que as massas apresentam um comportamento mais impulsivo, no qual existe uma falsa sensação de poder.

Este texto trata sobre dois comportamentos de indivíduos diante de movimentações em massa: groupthink e efeito manada. Tais comportamentos assemelham-se por inibirem uma posição racional de um indivíduo diante de apelos e escolhas tomadas por uma grande quantidade de pessoas.

Resumidamente, groupthink diz respeito ao comportamento de um indivíduo que deixa de manifestar sua opinião em prol de um consenso do grupo. Este comportamento reflete-se no receio de falar em público e também em voltar atrás em uma opinião.

O efeito manada, por sua vez, não está necessariamente ligado a decisões que exijam consenso, mas refere-se a um comportamento no qual um indivíduo realiza aquilo que as demais pessoas estão fazendo, muitas vezes sem parar para refletir sobre a decisão tomada. É o popular "maria vai com as outras".


Groupthink: em prol do consenso


Groupthink, de forma geral, refere-se a uma busca prematura por um consenso entre os membros de grupos, muitas vezes deixando a racionalidade e uma análise mais detalhada do problema de lado (Janis, 1982).

Grupos, assim como indivíduos, tomam diversas decisões através de atalhos mentais. Conforme Janis (1982, p. 3), os grupos podem trazer à tona o que há de melhor ou o que há de pior nos homens. Em situações de crise extrema, por exemplo, o comportamento dos grupos pode gerar pânico coletivo, atos violentos, entre outras manifestações que Janis (1982) chama de loucura dos grupos.

O termo “groupthink” foi utilizado inicialmente por Janis (1982) para se referir a um modo de pensar no qual as pessoas se envolvem quando estão profundamente engajadas em um grupo coesivo. Ou seja, ocorre quando esforços dos membros dos grupos para obter unanimidade nas decisões sobrepõem a motivação pessoal de cada membro do grupo de avaliar de forma realista as suas ações.

Um alto nível de amabilidade e de espírito de equipe entre os membros do grupo são manifestações de que os membros valorizam grandemente a sua participação naquele grupo e desejam permanecer afiliados, para Janis (1982, p. 245) este é o conceito de coesividade. Um elevado nível de coesividade em um grupo pode levar a ocorrência de groupthink.

Janis (1982, p. 174) apresenta três tipos de sintomas para a ocorrência do groupthink: (i) superestimativas dos grupos; (ii) mente fechada; (iii) pressão para a uniformidade.

1. Superestimativas dos grupos

O primeiro tipo de sintomas diz respeito a uma ilusão de invulnerabilidade e uma crença inquestionável a respeito da boa moral do grupo, levando os membros a ignorarem as consequências morais e éticas de suas decisões.

2. Mente fechada

O segundo tipo de sintomas da existência de groupthink existe quando os grupos realizam esforços coletivos a fim de buscar racionalizar informações que possam levar os membros a reconsiderar suas premissas previamente assumidas. Neste tipo também se enquadra um sintoma de quando os grupos apresentam visões estereotipadas de seus líderes inimigos.

3. Pressão para a uniformidade

O terceiro tipo de sintoma de groupthink tratado por Janis (1982, p. 175) está relacionado a pressões que levam os membros dos grupos a agir com uniformidade. O autor afirma que uma visão de unanimidade compartilhada pelos membros do grupo faz com que qualquer indivíduo que apresente fortes argumentos contra o consenso do grupo sofra pressão para se adequar aos estereótipos e ilusões compartilhadas pelo grupo.

Janis (1982) afirma que, na média, quanto maior a frequência com que um grupo demonstra os sintomas do groupthink, pior será a qualidade das decisões deste grupo.

Por exemplo: os grupos limitam suas escolhas apenas a poucas alternativas. Depois disso, os membros ignoram novas alternativas enfatizando seus riscos e desvantagens, ao mesmo tempo em que ignoram as vantagens e benefícios das alternativas descartadas. Finalmente, devido à confiança dos membros de que tudo ocorrerá bem, os membros falham em considerar o que dará errado e não desenvolvem planos alternativos (ALDAG e FULLER, 1993).

O efeito manada: seguindo a tendência

O termo "manada", quando utilizado na natureza, pode representar segurança. Mas quando o termo é aplicado para humanos, especialmente no contexto financeiro, a história muda.

O efeito manada é sinônimo de "seguir a tendência" e pode ser observado em diversos mercados, como o imobiliário e o de ações. Bekaert et al. (2014) explica que no efeito manada os investidores param de classificar os ativos por seus valores fundamentais. Além disso, este efeito pode conduzir um mercado à bolhas especulativas.

"O surgimento de bolhas especulativas é explicado como um processo auto-organizado de infecção entre os traders, que leva a preços de equilíbrio que se afastam dos valores fundamentais" (Lux, 1995). 

No meio científico, o efeito manada, embora muitas vezes identificado, costuma aparecer em baixa intensidade. Neste sentido, Lux (1995) explica que os especuladores não são simplesmente seguidores cegos da multidão: eles reagem rapidamente sobre o comportamento dos outros, a fim de não perder oportunidades de lucro, mas também tentam descobrir se o otimismo ou pessimismo prevalecente tem uma base sólida para o desenvolvimento real do mercado.



Por fim, em grandes proporções o efeito manada pode inclusive levar a um contágio financeiro. O efeito contágio pode ser entendido como a interferência das oscilações de um mercado em outro país ou região. Ainda, Bekaert et al. (2014) afirmam que o contágio aparece de forma mais substancial em portfolios de investidores individuais dentro de um mercado específico.

Conclusões

Tanto o groupthink quanto o efeito manada se referem a comportamentos de grupos, principalmente de grandes grupos ou massas. Os dois conceitos são distintos, embora próximos: groupthink refere-se a um comportamento no qual um ou alguns indivíduos tendem a deixar de manifestar sua opinião contraditória a fim de favorecer um consenso do grupo. Já o efeito manada diz respeito a seguir a tendência, mesmo que a decisão seja individual e não exija um consenso. Em grandes proporções, tais efeitos podem gerar sérios impactos em determinados ativos ou até mesmo em um mercado como um todo.

Referências

Bekaert, G., Ehrmann, M., & Fratzscher, M. (2014). The Global Crisis and Equity Market Contagion. Journal of Finance, 69(6), 2597 – 2649. 
Cipriani, M., & Guarino, A. (2005). Herd Behavior in a Laboratory Financial Market. The American Economic Review, 95(5), 1427–1443.
Janis, I. (1982). Groupthink: psychological studies of policy decisions and fiascoes (2nd ed.). Boston: Houghton Mifflin Company.
Le Bon, G. (1896). The crowd: a study of the popular mind. London: Ernest Benn.
Lux, T. (1995). Herd behaviour, bubbles and crashes. The Economic Journal, 105(431), 881–896.
Shiller, R. J. (1995). Concersation, information and herd behavior. Rhetoric and Economic Behavior, 85(2), 181–185.
Prates, W. (2012). A tomada de decisão individual e em grupo. Universidade Federal de Santa Catarina. Retrieved from http://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/99256

Seguindo as massas: efeito manada e groupthink

sábado, dezembro 13, 2014

A teoria do prospecto representa um dos principais marcos para o campo das finanças comportamentais. Este texto irá abordar como ocorreu o surgimento da teoria do prospecto, bem como suas principais características e impactos gerados para o campo das finanças.

Como começou?

A teoria do prospecto (TP) foi desenvolvida por Kahneman e Tversky (1979) em resposta a teorias normativas sobre o processo de tomada de decisão em contextos econômicos / financeiros.

A TP ganhou grande repercussão com o passar dos anos, sendo que o artigo de 1979 é um dos mais citados em toda a história do famoso periódico científico "Econometrica". Além disso, Daniel Kahneman foi laureado com o nobel de economia em 2002. Seu colega Amos Tversky já havia falecido.

Grande parte das teorias sobre tomada de decisão são normativas/prescritivas, como é o caso da teoria da utilidade esperada (TUE). Tais teorias buscam identificar qual seria a melhor decisão a ser tomada, ou seja, o comportamento ideal (Bernoulli, 1954; Friedman, 1948; von Neuman, 1953).

Na teoria da utilidade, a utilidade é obtida através da comparação de dois estados de riqueza. A teoria da utilidade esperada (TUE) considera que um ganho de R$ 500,00 possui a mesma utilidade que a desutilidade de perder a mesma quantia. Kahneman (2012) explica que uma das principais falhas desta abordagem é justamente não permitir que as utilidades para ganhos sejam calculadas de forma diferente do que para as perdas. A teoria da utilidade acabou por presumir, mesmo que de forma não intencional, que a distinção entre ganhos e perdas não importava.

No entanto, existe também um outro conjunto de teorias, as descritivas/positivas, as quais buscam compreender o comportamento real do tomador de decisões, como é o caso da teoria do prospecto (TP), desenvolvida por Kahneman e Tversky (1979).

Neste sentido, Tversky e Kahneman (1986) argumentam que os desvios do comportamento real dos indivíduos em relação aos modelos normativos são muito generalizados para serem ignorados, bem como muito sistemáticos para serem desconsiderados como erros aleatórios.



A teoria do prospecto se diferencia da teoria da utilidade esperada em diversos pontos. Primeiramente, ela destaca as diferenças entre os termos utilidade e valor: a utilidade é definida em termos de riqueza líquida, já o valor é dado em termos de ganhos e perdas, que por sua vez são definidos como desvios (positivos ou negativos) em relação a um determinado ponto de referência.

Outro ponto importante é que na TP a função valor para perdas é diferente da função valor para ganhos, pois no campo das perdas a função se torna convexa e mais íngreme. Por outro lado, no campo dos ganhos a função é côncava e não tão íngreme.

Estas diferenças nos levam a uma importante conclusão: na teoria do prospecto, uma vez que a função valor para perdas é mais íngreme do que para os ganhos, então as perdas parecem maiores que os ganhos. Por exemplo, a dor de perder R\$ 500,00 é maior do que o prazer de ganhar R\$ 500,00. Esta diferença de valor dado para ganhos e perdas que não é possível de ser obtida por meio da TUE.

A teoria do prospecto prediz que as preferências dependerão da forma pela qual o problema está estruturado. Além disso, uma das contribuições mais importantes da teoria do prospecto foi a inclusão do conceito de ponto de referência na análise do valor de determinado bem.

Se o ponto de referência é definido de tal forma que o resultado seja visto como um ganho, então a função valor será côncava e os indivíduos apresentarão um comportamento de maior aversão ao risco. Por outro lado, se o ponto de referência é visto como uma perda, então os indivíduos se comportarão com uma maior propensão ao risco e a função valor será convexa.

Função valor

A teoria do prospecto possui a chamada "função valor", a qual representa o valor que os indivíduos atribuem para determinados níveis de ganhos ou perdas. Conforme Kaustia (2010), a forma geral da função valor da teoria do prospecto é dada por:
\begin{equation} v(x)=\begin{cases}x^{\alpha}&\mbox{se }x\ge0\\ -\lambda(-x)^{\beta}&\mbox{se }x<0 \end{cases}, \label{eq:funcaotp} \end{equation}
sendo que $x$ é o ganho em relação a um ponto de referência, $\lambda$ é o coeficiente para a aversão à perdas, $\alpha$ é o coeficiente para aversão ao risco e $\beta$ representa o coeficiente da propensão ao risco. Através de experimentos, Tversky e Kahneman (1992) estimaram os seguintes valores para cada um dos coeficientes: $\lambda = 2,25$, $\alpha = 0,88$ e $\beta = 0,88$. Além disso, o valor que um indivíduo atribui a um prospecto é dado por: \begin{equation} Valor\quad do\quad prospecto=\int _{ -\infty }^{ +\infty }{ v(x)f(x)dx, } \label{eq:valorprospecto} \end{equation}
Expressa graficamente, a função valor possui o seguinte formato:
 

Das duas figuras acima, a letra (b) apresenta a função com os mesmos parâmetros apresentados inicialmente por Kahneman e Tversky (1979).

Características da teoria do prospecto

Entre as características da teoria do prospecto, podemos elencar três que estão entre as mais abordadas pela literatura: dependência de um ponto de referência, a saturação da percepção de ganhos e perdas e a aversão à perdas (Kahneman e Tversky, 1979). Estes três pontos serão abordados a seguir.

1) Ponto de referência

A dependência de um ponto de referência mostra que um indivíduo avalia as consequências, sejam elas monetárias ou não, a partir de um determinado nível que serve como padrão, geralmente este ponto é o status quo, isto é, a inércia.

Em termos de decisões de investimentos, o ponto de referência para um indivíduo pode ser o preço médio de compra de um ativo, o preço máximo ou mínimo atingido durante o período no qual o indivíduo esteve com o ativo em carteira, pode ser uma determinada variação percentual em relação a um índice de mercado, o preço médio de compra corrigido pelo ativo livre de risco entre outros.

O ponto de referência dependerá das preferências de cada indivíduo e também do contexto. Sendo assim, ganhos e perdas não estarão necessariamente vinculados aos conceitos de lucro ou prejuízo, mas sim a uma relação positiva ou negativa com o ponto de referência.

2) Saturação da percepção de ganhos / perdas

O segundo aspecto importante da teoria do prospecto diz respeito à saturação da percepção de ganhos e perdas. Em outras palavras, a função valor da teoria do prospecto afirma que os indivíduos atribuem percepções decrescentes do retorno, tanto para ganhos quanto para perdas.

Os termos $\alpha$ e $\beta$ da função valor da TP capturam a redução marginal da função. Estudos empíricos têm estimado que $\alpha$ e $\beta$ são normalmente iguais a $0,88$ e sempre menores que $1$ (Tversky e Kahneman, 1992; Barberis et al., 2001; Kaustia, 2010).

Supondo que $\alpha$ e $\beta$ possuam o mesmo valor, se este valor for menor que $1$, a curva irá acelerar negativamente; se for igual a $1$ a função será linear, exceto se $\lambda$ for diferente de $1$; e se for maior que $1$ ela irá acelerar positivamente.

3) Aversão à perdas

O terceiro aspecto relevante é a aversão à perdas, que explicaria o fato de a função valor ser mais íngreme para as perdas do que para os ganhos. Na função valor da TP o coeficiente $\lambda$ representa esta propensão ao risco no domínio das perdas que, segundo a teoria do prospecto, seria fruto da aversão à perdas.

O valor canônico de $\lambda=2,25$ indica que, se $\alpha = \beta$, então as perdas possuem um impacto $2,25$ vezes maior do que os ganhos. Se $\lambda = 1,00$ então os ganhos possuem o mesmo impacto que as perdas. Se $\lambda < 1,00$, então os ganhos possuem um impacto maior do que as perdas (Barberis et al., 2001).

Considerações

Enquanto a teoria da utilidade esperada é tratada como um modelo normativo / prescritivo, a teoria do prospecto possui um caráter descritivo / positivo, por mostrar como os indivíduos de fato se comportam e não como eles deveriam se comportar (Shefrin, 2010).

Conforme Hastie e Dawes (2010), a teoria do prospecto é a descrição mais abrangente em relação ao processo de tomada de decisão, pois sintetiza vários séculos de observações empíricas e inferências a respeito do comportamento humano diante de decisões. Além disso, a TP forneceu novas perspectivas e tem servido de fomento a novos métodos de previsão do comportamento humano.

Referências

Barberis, N., Huang, M., & Santos, T. (2001). Prospect theory and asset prices. Quarterly Journal of Economics, 116(1), 1–53.
Bernoulli, D. (1954). Exposition of a new theory on the measurement of risk. Econometrica, 22(1), 23–36.
Friedman, M., & Savage, L. J. (1948). The Utility Analysis of Choices Involving Risk. Journal of Political Economy, 56(4), 279.
Hastie, R., & Dawes, R. (2010). Rational Choice in an Uncertain World: The Psychology of Judgment and Decision Making (2nd ed., p. 392). Pittsburgh: SAGE Publications.
Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar (p. 607). Rio de Janeiro: Objetiva.
Kaustia, M. (2010). Prospect theory and the disposition effect. Journal of Financial and Quantitative Analysis, 45(3), 791–812.
Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect theory: An analysis of decision under risk. Econometrica, 47(2), 263–291.
Shefrin, H. (2010). Behavioralizing finance. Hanover: Now Pub.
Tversky, A., & Kahneman, D. (1992). Advances in Prospect Theory: Cumulative Representation of Uncertainty. Journal of Risk and Uncertainty, 5(4), 297–323.
Von Neuman, J., & Frechet, M. (1953). Communication on the Borel Notes. Econometrica, 21(1), 124–127.

Teoria do Prospecto (ou Teoria da Perspectiva)

quarta-feira, outubro 22, 2014

Nos últimos anos, pesquisadores da área de psicologia cognitiva têm buscado explicar a forma pela qual o ser humano toma decisões através da divisão da função cognitiva em dois grupos genéricos: sistema 1 e sistema 2. Enquanto o primeiro representa um modo intuitivo de agir, o segundo é caracterizado por ser um modo mais controlado de tomar decisões. Esta abordagem separa a intuição da razão (Evans, 2010).

Podemos dizer que as operações realizadas no sistema 1 são normalmente rápidas, não geram esforços, provocam associações e são carregadas de emoções. Por outro lado, o sistema 2 é mais lento, exige mais esforços e é constantemente submetido a controles (de Neys, 2006).


Como o sistema 1 não exige esforços, ele pode ser combinado com outras tarefas (que igualmente não exijam esforços). Já a capacidade de atividade mental no sistema 2 é limitada, ou seja, uma tarefa que requer esforços tende a anular outra tarefa do mesmo nível de dificuldade (Kahneman, 2003).

Tanto as operações do sistema 1 quanto as do sistema 2 não estão restritas apenas ao processamento de situações correntes. O sistema 1, por exemplo, lida tanto com conceitos quanto com percepções e pode ser provocado pela linguagem. Por sua vez, o sistema 2 está envolvido em julgamentos que são originários das impressões obtidas através do sistema 1.

Operações matemáticas básicas, como $2+2$ ou o nome de uma capital conhecida são exemplos de operações tratadas pelo sistema 1. Todavia, operações matemáticas mais complexas, como multiplicações com números de dois algarismos, focar a audição em um som específico em meio a um ambiente com ruídos, ou checar a validade de um argumento lógico complexo, fazem parte das operações feitas pelo sistema 2 (Kahneman, 2003).

É possível encontrar uma discussão a respeito das evidências empíricas da atuação dos sistemas 1 e 2 na tomada de decisão em autores como Evans (2003, 2010) e De Neys (2006), bem como Wason e Evans (1974).

Teste das quatro cartas de Wason

De forma geral, as pessoas tendem a tomar decisões rápidas por associação (Evans, 2003) - ler sobre heurísticas e vieses. A tarefa de Wason é um exemplo da dupla forma de raciocínio dos sistemas 1 e 2. No teste, as escolhas que podem ser feitas sofrem alterações de conteúdo e de contexto (Wason, 1966, 1968) .

Considerando que na alternativa "a" cada carta possui um número de um lado e uma letra de outro e que na alternativa "b" cada carta possui uma bebida de uma lado e uma idade de outro, a tarefa consiste em escolher quantos cartões forem necessários para validar logicamente as afirmativas "a" e "b" e verificar se são verdadeiras ou falsas conforme a figura abaixo.

Teste de Wason - exemplo extraído de Evans (2003)

A pergunta que deve ser respondida para resolver o teste é: no mínimo, quantas e quais cartas devem ser viradas para que seja possível verificar logicamente a validade de cada uma das sentenças?

Resposta:

Na alternativa "a" a resposta correta é que deveríamos virar os cartões "A" e "7", pois assim conseguiríamos encontrar um cartão que possui um "A" de um lado e não possui um "3" do outro. No entanto, a maioria dos indivíduos costuma responder que na alternativa "a'' deveríamos virar os cartões "A" e "3".

A alternativa "b" da figura representa o mesmo jogo, apenas altera o contexto. O respondente precisa virar os cartões para visualizar se a afirmativa é verdadeira. Na letra "b" a maioria dos indivíduos costuma responder que é necessário virar os cartões "bebe cerveja'' e "16 anos", ou seja, a afirmativa correta e que corresponde aos cartões "A" e "7" da primeira alternativa.

Esta é uma questão de raciocínio lógico, que envolve uma proposição condicional do tipo "Se p, então q" ($p \rightarrow q $). Conforme a tabela-verdade de uma proposição condicional, o único momento em que esta proposição é falsa ocorre quando "p" é verdadeira e "q" é falsa. Sendo assim, para verificar a validade na alternativa "b" do teste de Wason, por exemplo, basta analisar se em algum momento o indivíduo "bebe cerveja" e possui menos de 18 anos. Portanto, a única forma de checar a validade é virar os cartões "bebe cerveja" e "16 anos de idade". A alternativa "a" do teste possui a mesma resposta, alterando apenas o conteúdo dos cartões.

A explicação para o que ocorre com as respostas do teste de Wason, conforme Evans (2003), diz respeito ao sistema 1 e ao sistema 2. No primeiro caso - alternativa "a" - os indivíduos relacionam, através do sistema 1, os dados "A" e "3", pois estes constam no enunciado, explica Evans (2003). Essa associação induz o indivíduo a responder erroneamente. No segundo caso - alternativa "b" - os respondentes precisam refletir mais a respeito da resposta, utilizando o sistema 2, que leva o indivíduo a responder corretamente.

Adicionalmente, Wason e Evans (1974) afirmam que a introdução de sentenças negativas usadas em uma questão que exige raciocínio dedutivo dos respondentes afeta o comportamento destes de forma sistemática e difere do comportamento esperado de acordo com a estrutura lógica da questão. Os autores solicitaram aos respondentes que justificassem suas respostas, inclusive aquelas com a introdução de sentenças negativas, que estavam em desacordo com a ordem lógica esperada. Não foram obtidas respostas plausíveis, que pudessem justificar o comportamento dos respondentes.

Dessa forma, Wason e Evans (1974) sugerem a existência de pelo menos duas formas de raciocínio, capazes de ocasionar conflitos entre o comportamento e o pensamento consciente. Ou seja, Wason e Evans (1974) já estavam percebendo a existência do que seria posteriormente denominado de sistema 1 e sistema 2.

Segue citação do próprio Wason (1968):
Dois experimentos foram realizados para investigar a dificuldade de fazer a inferência contra-positivo de sentenças condicionais da forma, "se P, então Q." Essa inferência, que não-P resulta da não-Q, requer a transformação das informações apresentadas na sentença condicional. Sugere-se que a dificuldade é devido a uma disposição mental para se esperar uma relação de verdade, de correspondência, ou de combinação entre as frases e estados de coisas. 

Considerações

A ideia de que existem duas formas gerais de pensar e tomar decisões tem se tornado popular recentemente, sendo que Kahneman (2012) é um dos responsáveis por esta popularização. A proposta é de que existem dois sistemas que influenciam na maneira pela qual os indivíduos tomam decisões.

O primeiro sistema, conforme Evans (2010), tem sido associado com uma forma de cognição que é primária em termos evolucionários, relacionada com a cognição dos animais e é normalmente operado de forma inconsciente.

O segundo sistema, por sua vez, é responsável pelo raciocínio dedutivo, pelo planejamento, pelo aprendizado, entre outros.

Uma crítica a esta abordagem refere-se à utilização do termo "sistema". Evans (2010) afirma que os autores que criticam a classificação em dois sistemas argumentam que existem muito mais do que dois sistemas operando no processo de tomada de decisão. Sendo assim, a proposta de Evans (2010) é substituir o termo "sistema" por "tipo". Dessa forma, tanto o "tipo 1", quanto o "tipo 2" são compostos de diversos sistemas e sub-sistemas que possuem, respectivamente, as características do pensamento intuitivo e da razão.

Não é possível definir se a intuição é melhor ou pior do que a razão. Em algumas situações o uso do sistema 1 pode ser muito benéfico, como no caso de tomar decisões rápidas no trânsito para evitar um acidente. Contudo, em outras situações o sistema 1 pode utilizar-se de heurísticas e de vieses, bloqueando parte da capacidade que temos de raciocinar e escolher a melhor decisão.

Por fim, cabe ressaltar que os dois sistemas (ou tipos) atuam nas mais variadas áreas do nosso cotidiano em que precisamos tomar decisões. Sendo assim, a tarefa de cada um é treinar o uso da razão e do controle e identificar quais os momentos nos quais cabe o uso do sistema 1 ou do sistema 2.

Referências

de Neys, W. (2006). Dual processing in reasoning: two systems but one reasoner. Psychological Science, 17(5), 428–33.
Evans, J. S. B. T. (2003). In two minds: dual-process accounts of reasoning. Trends in Cognitive Sciences, 7(10), 454–459.
Evans, J. S. B. T. (2010). Intuition and Reasoning: A Dual-Process Perspective. Psychological Inquiry, 21(4), 313–326.
Kahneman, D. (2003). A Perspective on Judgment and Choice: mapping bounded rationality. American Psychologist, 58(9), 697–720.
Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar (p. 607). Rio de Janeiro: Objetiva.
Wason, P. C. (1966). New horizons in psychology. In B. M. Foss. Baltimore, MD: Penguin.
Wason, P. C. (1968). Reasoning about a rule. Quarterly Journal of Experimental Psychology, 20(3), 273–281.
Wason, P. C., & Evans, J. T. (1974). Dual processes in reasoning? Cognition, 3(2), 141–154.

Duas formas de pensar: sistema 1 e sistema 2

sábado, outubro 11, 2014

Estimar probabilidades não é uma tarefa fácil. Aliás, é uma tarefa praticamente impossível em determinadas situações que envolvem eventos incertos. Quanto mais complexa a tarefa, mais difícil se torna definir o percentual de chance de ocorrência de certa situação.

Dizer que a probabilidade de uma moeda cair cara ou coroa é de 50% para cada lado é uma tarefa simples, rápida e que proporciona um resultado correto, desde que o método de jogar a moeda seja justo e a própria moeda não possua alterações físicas que a façam cair mais de um lado do que de outro.

Agora, ao adicionarmos um certo grau de complexidade, fica cada vez mais difícil dimensionarmos a probabilidade de ocorrência de cada um dos possíveis eventos em dada tarefa.

Por exemplo, podemos ter nosso palpite acerca de quem vencerá a próxima eleição, mas nunca saberemos ao certo a exata probabilidade, pois a quantidade de fatores que podem influenciar na escolha de cada eleitor vai além do nosso alcance. Mas mesmo assim, quando somos questionados sobre quem vencerá a eleição costumamos ter na ponta da língua nossas estimativas para cada um dos candidatos.


A essas respostas rápidas que costumamos dar a perguntas extremamente complexas chamamos de heurísticas, ou seja, são atalhos mentais que facilitam a tomada de decisão.

Isoladamente as heurísticas não representam algo ruim. Pelo contrário, em contextos em que precisamos tomar diversas decisões complexas de forma rápida as heurísticas possuem papel fundamental, pois viabilizam escolhas adequadas, embora imperfeitas.

"Heurística é um procedimento simples que ajuda a encontrar respostas adequadas, ainda que geralmente imperfeitas, para perguntas difíceis. A palavra vem da mesma raiz que heureca" (Kahneman, 2012, p. 127).
As heurísticas são estratégias gerais que podem conduzir a decisões adequadas. O que ocorre é que nós, seres humanos, costumamos falhar em definir os limites dessas estratégias, fazendo com que nem sempre a melhor decisão seja escolhida.

A utilização de heurísticas pode ocasionar vieses, ou seja, uma tendência sistemática de violar alguma forma de racionalidade teoricamente predominante. O que acontece é que os vieses acabam distorcendo, ou pelo menos limitando, a capacidade de tomarmos decisões racionais (Sternberg, 2008). Estes erros são fruto de uma resposta incompleta, que não permite que a decisão tomada seja ótima.

Conforme Shefrin (2010), apesar de alguns vieses estarem associados especificamente a algumas heurísticas, outros derivam de uma séries de outros fatores. Tende a ser mais fácil identificar a existência de um viés no processo decisório do que identificar a sua causa.

A lista de vieses cognitivos é extensa. Mas alguns exemplos são: efeito dotação, efeito disposição, status quo, excesso de confiança / otimismo, aversão à perdas, entre outros. Mais exemplos podem ser vistos aqui.

A heurística é um meio de simplificar tarefas impossíveis. Neste sentido, uma das ideias centrais ao tratar de heurísticas diz respeito à substituição. As pessoas se utilizam de heurísticas, por exemplo, ao fazer julgamentos de probabilidade sem sequer ter estudado probabilidade alguma vez na vida (como o exemplo das eleições dado acima).

Quando temos uma pergunta difícil para responder surgem as perguntas heurísticas, que sempre fornecem uma resposta pronta para cada uma das difíceis perguntas-alvo.

A pergunta-alvo é a avaliação que tentamos produzir. A pergunta-heurística é a pergunta mais simples que respondemos em lugar da pergunta-alvo. Seguem alguns exemplos retirados de Kahneman (2012):

Pergunta-alvo Pergunta-heurística
Até que ponto você contribuiria para salvar espécies em risco de extinção? Até que ponto me emociono quando penso em golfinhos morrendo?
Qual será a popularidade do presidente daqui a seis meses? Qual é a popularidade do presidente hoje?
O quanto você está feliz com sua vida atualmente? Qual é o meu humor neste exato momento?


Vale lembrar que não estamos fadados a tomar nossas decisões sempre por meio de heurísticas. Temos a capacidade de não decidir por meio desse atalho intuitivo.

Inicialmente, Daniel Kahneman e Amos Tversky identificaram três principais heurísticas: a (i) heurística da representatividade, (ii) da disponibilidade e (iii) da ancoragem (Tversky e Kahneman, 1974). Além disso, outra importante heurística é a do afeto (Kahneman, 2012).


Heurística da representatividade

Afirma que os indivíduos avaliam a probabilidade de um evento “B” pelo nível em que um evento “A” se assemelha de “B”. Um exemplo dado por Tversky e Kahneman (1974) ajuda na compreensão desta heurística:

Considerando que um indivíduo é muito tímido e retraído, está sempre pronto a ajudar, porém possui pouco interesse nas pessoas e no mundo a sua volta; é tranquilo e organizado; tem necessidade de ordem e estrutura e uma paixão por detalhes. Além disso, podemos supor que este indivíduo é engajado em uma profissão específica.

Dessa forma, com base nas características do indivíduo as pessoas tendem a imaginar a possível profissão dele utilizando o estereótipo de diversas profissões (como por exemplo, físico, matemático, bibliotecário, vendedor, médico ou fazendeiro). Contudo, utilizar esta abordagem a julgamentos de probabilidade pode conduzir a sérios erros, pois a similaridade (ou representatividade) não é influenciada por diversos fatores que deveriam afetar julgamentos de probabilidade.

Em outras palavras, representatividade é a tendência em utilizar estereótipos para realizar julgamentos. Um exemplo desta heurística no campo das finanças é crer que o desempenho brilhante de uma organização no passado é "representativo" de um desempenho geral que a empresa continuará a obter no futuro (Boussaidi, 2013).

Heurística da disponibilidade

A segunda heurística é a da disponibilidade.  Significa que as pessoas de formar geral julgam a frequência ou a probabilidade de um evento pela facilidade com que exemplos ocorrem em suas mentes (Tversky e Kahneman, 1974).

Por exemplo, um indivíduo pode calcular a probabilidade de um jovem ter problemas cardíacos recordando quantos casos deste tipo já ocorreram com seus conhecidos.

A disponibilidade acompanha os seres humanos na vida cotidiana e de maneira geral é um método de eficácia relativa na tomada de decisões sobre frequência (Matlin, 2004).

Heurística da ancoragem

A terceira heurística é a da ancoragem. Pode-se dizer que a ancoragem é um desdobramento da heurística da representatividade. Nela os indivíduos focalizam a atenção sobre uma informação recentemente recebida e a usam como referência para fazer uma estimativa ou tomar uma decisão.

A âncora é um valor relevante que está disponível ao tomador de decisão. As pessoas fazem estimativas a partir de um valor inicial, que é ajustado para produzir a resposta final. A âncora pode ser inserida na formulação do problema em questão, ou pode ser resultado de uma análise parcial. (Tversky e Kahneman, 1974).

Ainda a respeito da ancoragem, Tversky e Kahneman (1974, p.1128) pediram aos participantes de seu estudo que girassem uma roleta para sortear um número qualquer entre zero e cem. Após o sorteio os autores realizaram algumas perguntas sobre certas quantidades (como por exemplo, quantos países africanos eram membros da ONU). Como resultados os pesquisadores perceberam que aquele número aleatório previamente sorteado teve forte influência nas respostas dos participantes. Grupos de pessoas que receberam números próximos a 10 no sorteio estimaram que cerca de 25 países africanos eram membros da ONU, enquanto esta estimativa subiu para 45 quando o número retirado na roleta foi próximo a 65.

Heurística do afeto

Relacionada com a ancoragem, a heurística do afeto trata de deixar as simpatias e antipatias determinarem as crenças acerca do mundo. Por exemplo, uma pessoa que antipatiza com carne vermelha, energia nuclear, tatuagens ou motocicletas, provavelmente supervaloriza os riscos e despreza os benefícios destas ilustrações.

Em outras palavras, a heurística do afeto está relacionada com as qualidades "bom" ou "ruim" que atribuímos a certas experiências, com ou sem consciência.

Considerações

As heurísticas são atalhos, respostas rápidas e prontas que temos na ponta da língua para diversas perguntas complexas que nos são feitas. Em muitos casos as heurísticas são boas e refletem em decisões rápidas e com resultados satisfatórios, mesmo que imperfeitos ou incompletos. No entanto, o uso destes atalhos também pode conduzir a erros sistemáticos, os chamados vieses cognitivos.

Uma forma de reduzir o impacto das heurísticas no processo de tomada de decisão é conhecê-las e, cada vez que percebermos estar prestes a utilizar um atalho mental, sujeitarmos essa decisão que precisa ser tomada a uma avaliação mais detalhada e racional. Conforme explica Kahneman (2012), "o Sistema 2 tem a oportunidade de rejeitar essa resposta intuitiva ou de modificá-la incorporando outra informação".

Obs.: Kahneman (2012) denomina Sistema 1 e Sistema 2 como duas formas de pensar, sendo a primeira rápida e intuitiva e a segunda lenta, porém mais racional.

Referências

Boussaidi, R. (2013). Representativeness Heuristic, Investor Sentiment and Overreaction to Accounting Earnings: The Case of the Tunisian Stock Market. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 81(28), 9–21.
Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar (p. 607). Rio de Janeiro: Objetiva.
Matlin, M. (2004). Psicologia Cognitiva (5a. ed.). Rio de Janeiro: LTC Editora.
Shefrin, H. (2010). Behavioralizing finance. Hanover: Now Pub.
Sternberg, R. J., & Mio, J. S. (2009). Cognitive psychology. Wadsworth Publishing Company.
Tversky, A., & Kahneman, D. (1974). Judgment under uncertainty: Heuristics and biases. Science, 185(4157), 1124–1131.

Heurísticas e vieses: atalhos e erros na tomada de decisão

sábado, outubro 04, 2014

Manter o status quo significa não fazer nada, ou simplesmente deixar as coisas como estão. Nas decisões que tomamos diariamente quase sempre existe uma opção que carrega a possibilidade de deixar as coisas como estão. Seguir a política habitual da empresa, eleger um candidato à reeleição, comprar sempre a mesma marca de determinado produto ou permanecer no mesmo emprego são alguns exemplos de decisões nas quais se opta pela alternativa que contém o status quo.

Kahneman, Knetsch e Thaler (1991) afirmam  o ser humano possui uma forte tendência a manter o status quo, pois as desvantagens de sair da posição atual parecem muito maiores que as vantagens.

Sobre este aspecto:
"As desvantagens de uma mudança assomam como maiores do que suas vantagens, induzindo a um viés que favorece o status quo (Kahneman, 2012)."

Em uma importante pesquisa, Samuelson e Zeckhauser (1988) aplicaram questionários para diferentes grupos de pessoas. Em certo grupo as questões do questionário possuíam uma alternativa chamada de status quo, sendo que ao marcar esta opção o indivíduo indicava que preferia não alterar seu estado atual elucidado pelo enunciado. Marcando qualquer das outras opções ele indicava a escolha por algo novo. Para outro grupo, as mesmas alternativas foram apresentadas, porém, nenhuma possuía a característica de status quo. Os autores perceberam uma forte inclinação dos participantes a escolherem a alternativa que continha o status quo, mesmo com a questão abordando situações simuladas.

Além dos questionários, Samuelson e Zeckhauser (1988) também observaram a implantação de um novo plano de saúde para os professores na Universidade de Harvard. Perceberam que novos professores em geral optavam pelo plano novo, enquanto os antigos raramente preferiam mudar o plano que possuíam.

Manter o estado atual, por si só, não implica necessariamente em algo ruim. O ponto é que os indivíduos aceitam muito risco a fim de manter certo status quo. Dessa forma, as pessoas cometem erros na definição de probabilidades para os eventos futuros, influenciados pela tendência a deixar as coisas como estão.

O estado atual serve como um ponto de referência. Um indivíduo mediano tende a apresentar maior interesse nas alterações de sua riqueza baseadas em um determinado ponto de referência do que no estado final dessa riqueza.

Efeito Dotação: "o que é meu é melhor"

De forma relata ao viés do status quo, o efeito dotação é um padrão no qual as pessoas exigem mais para desistir de um objeto do que estariam dispostas a pagar pelo mesmo.

Este efeito é considerado uma anomalia em relação à teoria econômica neoclássica, na qual o valor que uma pessoa se dispõe a pagar por um bem é o mesmo que ela estaria disposta a receber em troca por um bem que já possui.

Knetsch e Sinden (1984) realizaram experimentos a fim de verificar se existe discrepância entre o valor aceitável por um indivíduo para pagar por um bem que não possui (Willingness To Pay - WTP) e o valor aceitável para vender este mesmo bem (Willingness To Accept - WTA), considerando que a pessoa já o possui. Os autores encontraram uma forte diferença entre WTP e WTA, tendo sido a segunda significativamente maior que a primeira. Ou seja, os indivíduos subavaliam um bem que não é de sua propriedade e supervalorizam um bem que já possuem.

De modo complementar, Kahneman, Knetsch e Thaler (1990) concluíram, através de diversos experimentos, que a WTA (disposição para aceitar) foi expressivamente superior à WTP (disposição para pagar). Os autores distribuíram alguns bens de baixo valor em seus experimentos e analisaram como os indivíduos se comportaram ao negociarem estes bens.

Em um dos experimentos realizados por Kahneman, Knetsch e Thaler (1990), metade das pessoas participantes receberam canecas, cujo valor real de mercado era de \$ 6,00, e a outra metade não. Aqueles que não receberam canecas poderiam escolher, em um questionário, entre levar dinheiro para casa ou fazer uma oferta para comprar as canecas dos demais participantes. Por outro lado, os participantes que receberam as canecas também poderiam escolher entre levar as canecas para casa ou vender para os demais participantes sem caneca e levar o dinheiro para casa. O que os autores perceberam foi que aqueles indivíduos que recebiam as canecas davam mais valor a elas do que aqueles indivíduos que não as tinham. Em média, aqueles que possuíam a caneca desejavam um valor de \$ 7,12 para se desfazerem do bem. Já aqueles que não possuíam bens, ofereceram em média \$ 3,15 pelas canecas.

Nos estudos que procuram identificar a presença do efeito dotação, geralmente é possível também observar a preferência por manter o status quo, como no exemplo das garrafas de vinho citado por Kahneman, Knetsch e Thaler (1991). Neste exemplo, um indivíduo teria comprado algumas garrafas de um determinado vinho que se valorizaram bastante com o tempo. Em determinado momento, este indivíduo não está disposto a comprar mais garrafas por achar que elas estão muito caras e nem está disposto a vender suas garrafas por achar que o preço ainda pode subir mais. O fato de o indivíduo não vender e nem comprar outras garrafas pode ser explicado por ele valorizar mais os bens que são de sua propriedade (efeito dotação), mas também por uma tendência a manter o estado atual, que gera preconceitos contra comprar ou vender mais garrafas (status quo).


Um outro exemplo é o de um indivíduo que compra antecipadamente um ingresso para ir a um determinado show. Supondo que o preço do ingresso aumente conforme o dia do evento se aproxima, seria racional que este indivíduo vendesse seu ingresso para auferir o lucro. Porém, dificilmente esta pessoa irá vender o ingresso, pois ela não percebe aquele show como um valor de troca, mas sim como um valor de uso.

Pelo teorema de Coase, as pessoas deveriam se desfazer dos bens sempre que fosse mais vantajoso em termos econômicos. No entanto, através de experimentos como os citados é possível perceber que os seres humanos não se comportam de forma racional o tempo todo.


O papel da aversão à perdas

Alguns vieses comportamentais, como o efeito dotação e o viés do status quo, podem ser explicados com base na aversão a perdas (loss aversion).

A aversão a perdas é representada pela diferença positiva entre o preço que um indivíduo está disposto a receber para desistir de certo item e o preço que este indivíduo está disposto a pagar pelo mesmo item (Thaler, 1980).

Muitas das escolhas feitas sob risco não estão baseadas em riquezas ou bem-estar, mas em mudanças de um ponto neutro de referência para outro. Dessa forma, o papel da aversão a perdas reflete em uma falta de motivação para se desfazer de determinado bem.

Considerações 

A ideia central deste texto foi discutir como, em média, somos afetados pela tendência em manter a situação atual das coisas (status quo). Além disto, este comportamento está fortemente relacionado com outro viés decisório que possuímos: a tendência de sobreavaliar bens próprios e subavaliar bens alheios (efeito dotação). Cabe ressaltar que o ponto prejudicial destes comportamentos reflete em uma má percepção e estimativa dos riscos das decisões que tomamos.

Para finalizar, seguem algumas citações do livro Rápido e Devagar, de Daniel Kahneman...
Todo mundo conhece alguém para quem gastar é algo doloroso, embora a pessoa seja objetivamente bem de vida. [p. 372]
O efeito dotação não é universal. Se alguém lhe pede para trocar uma nota de cinco dólares por cinco de um, você entrega as cinco sem nenhuma sensação de perda. [p. 366]
Estudos recentes da psicologia da "tomada de decisão em condição de pobreza" sugerem que os pobres são outro grupo em que não se espera encontrar o efeito dotação. Ser pobre, na teoria da perspectiva, é viver abaixo do próprio ponto de referência. Há bens que os pobres precisam e que não podem adquirir, de modo que estão sempre "no prejuízo". Pequenas quantias de dinheiro que recebem são assim percebidas como redução de prejuízo, não como ganho. [p. 372]

Referências

Kahneman, D., Knetsch, J., & Thaler, R. (1990). Experimental tests of the endowment effect and the Coase theorem. Journal of Political Economy, 98(6), 1325–1348.
Kahneman, D., Knetsch, J., & Thaler, R. (1991). Anomalies: The endowment effect, loss aversion, and status quo bias. Journal of Economic Perspectives, 5(1), 193–206.
Kahneman, D. (2012). Rápido e devagar: duas formas de pensar (p. 607). Rio de Janeiro: Objetiva.
Knetsch, J., & Sinden, J. (1984). Willingness to pay and compensation demanded: Experimental evidence of an unexpected disparity in measures of value. Quarterly Journal of Economics99(3), 507–521.
Samuelson, W., & Zeckhauser, R. (1988). Status quo bias in decision making. Journal of Risk and Uncertainty, 1(1), 7–59.
Thaler, R. (1980). Toward a positive theory of consumer choice. Journal of Economic Behavior and Organization, 1(1), 39–60.

Manter o status quo: o estado atual das coisas